CAPÍTULO 1 - DIREITO ADMINISTRATIVO. ORIGEM. OBJETO. CONCEITO. FONTES. INTERPRETAÇÃO. SISTEMAS
1.1. Origem
O início do século XIX marca o surgimento do direito administrativo como ramo autônomo da ciência do Direito. Anteriormente, o tratamento jurídico das funções administrativas do Estado estava inserido no direito comum, sem especificação ou preocupação próprias.
É comum a afirmação de que o direito administrativo nasceu com as Revoluções que puseram fim ao velho regime absolutista. Foi com o Estado de Direito que se cogitou de normas delimitadoras da organização e da ação do Poder Público.
Para a formação do direito administrativo foram fundamentais as contibuições do direito francês, do direito alemão e do direito italiano.
A delimitação do objeto, do método, dos institutos, dos princípios e do regime jurídico próprios do direito administrativo ocorreu, preponderantemente, na França. A jurisprudência do Conselho de Estado, órgão máximo da jurisdição administrativa, apartada da jurisdição comum (sistema da dualidade de jurisdição), foi a maior responsável pelos avanços da França nessa área.
No famoso caso Blanco, ocorrido em 1873, restou decido que a apreciação da responsabilidade civil do Estado, decorrente do atropelamento da menina Agnès Blanco por veículo da Companhia Nacional de Manufatura de Fumo, deveria ser realizada pelos órgãos da jurisdição administrativa em termos publicísticos, afastado o direito civil, pela presença do Estado como parte.
1.2. Objeto
O objeto ou conteúdo do direito admnistrativo varia, assim como o Estado, no tempo e no espaço. Inicialmente, as atividades da Administração Pública abrangiam a segurança interna e externa e alguns serviços (públicos) essenciais. O crescimento das necessidades coletivas, segundo concepções políticas e econômicas bem definidas, centradas sobretudo no chamado Estado Social, alargou as funções administrativas do Poder Público. Os serviços públicos passaram a abranger serviços sociais, comerciais e industriais. O poder de polícia chegou a proteção ao meio ambiente e a defesa do consumidor. A atuação do Estado atingiu à esfera da atividade econômica de natureza privada. A atividade administrativa passou a incentivar a iniciativa privada de utilidade pública com subvenções, financiamentos, benefícios fiscais e outros. Em suma, a administração passou a abranger, num sentido bem amplo: fomento, polícia, serviço público e intervenção.
1.3. Conceito
O conceito de direito administrativo depende do critério adotado para formulá-lo. Neste sentido, encontramos os seguintes critérios principais:
a) do serviço público;
b) do Poder Executivo;
c) das relações jurídicas (rege as relações entre a Administração e os administrados);
d) teleológico (rege a atividade do Estado para o cumprimento de seus fins);
e) negativo ou residual (aquilo que não seja atividade legislativa ou judicial);
f) da Administração Pública.
Vejamos duas definições:
a) de Hely Lopes Meirelles: "conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado".
b) de Maria Sylvia Zanella Di Pietro: "ramo do direito público que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a Administração Pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública".
1.4. Fontes
As principais fontes, como formas de expressão do direito administrativo, são:
a) a lei;
b) a jurisprudência;
c) a doutrina;
d) o costume;
e) os princípios gerais de direito.
Em relação ao direito administrativo no Brasil devem ser ressaltados os seguintes aspectos:
a) está fundamentalmente definido na Constituição;
b) não está codificado;
c) todos os entes da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) possuem autonomia para legislar sobre a matéria.
1.5. Interpretação
Hermenêutica jurídica é um domínio teórico, especulativo, cujo objeto é a formulação, o estudo e a sistematização dos princípios e regras de interpretação do direito.
Interpretação é a atividade intelectual com a finalidade de declarar o conteúdo, o sentido e o alcance das normas jurídicas.
A interpretação das normas de direito administrativo deve considerar os cânones do regime jurídico-administrativo, notadamente:
a) posição de superioridade da Administração Pública em relação aos administrados;
b) o manejo de competências discricionárias por parte da Administração Pública;
c) a presunção de legitimidade dos atos administrativos.
Interpretação quanto à origem. Pode ser legislativa, administrativa ou judicial. Alguns acrescentam a interpretação doutrinária.
Interpretação quanto aos resultados ou à extensão. Pode ser declaratória, extensiva ou restritiva.
Há certa convergência em torno das premissas de que as regras gerais, as que estabelecem benefícios, as punitivas e as de natureza fiscal são interpretadas restritivamente. Por outro lado, as que asseguram direitos, estabelecem garantias e fixam prazos são interpretadas extensivamente.
Métodos clássicos de interpretação:
a) gramatical ou literal: considera o conteúdo semântico (o sentido possível) das palavras. O apego extremo ao texto pode conduzir à injustiça, à fraude ou ao ridículo.
As palavras empregadas na Constituição devem ser entendidas em seu sentido geral e comum, a menos que resulte claramente de seu texto que o constituinte pretendeu referir-se ao seu sentido técnico-jurídico (Linares Quintana).
As dificuldades da interpretação aumentam na presença de termos polissêmicos e conceitos indeterminados.
RECURSO EXTRAORDINARIO .- RE-67843/DF RECURSO EXTRAORDINARIO .- RE-54896 |
b) histórica: busca o sentido da lei através dos precedentes legislativos e dos trabalhos preparatórios.
Apesar das críticas ao método histórico, ele desempenha um papel destacado na interpretação constitucional.
" O critério de mérito aferível por concurso público de provas ou provas e títulos é, no atual sistema constitucional, ressalvados os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração, indispensável para cargo ou emprego público isolado ou de carreira.(...)
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c) teleológica: procura revelar o fim da norma, o valor ou bem jurídico visado pelo ordenamento com a sua edição.
AGRAG-168149/RS - AG. REG. EM AG. DE INST. OU DE PETICAO |
d) sistemática: procura o sentido da norma nas suas relações com as demais (formação de um todo, de um sistema).
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime.
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Da aplicação dos diversos métodos pode resultar uma convergência ou uma divergência de resultados. Na última hipótese, duas diretrizes devem ser observadas: (a) os limites e possibilidades do texto e (b) os métodos objetivos (sistemático e teleológico) têm preferência sobre os métodos subjetivos (como o histórico).
1.6. Sistemas Administrativos
São basicamente dois os sistemas administrativos (regimes de correção dos atos administrativos ilícitos):
a) unidade de jurisdição (jurisdição única ou sistema judiciário). O Poder Judiciário aprecia, com definitividade, os conflitos surgidos das relações jurídicas entre a Administração e os administrados. Esse é o sistema adotado no Brasil;
b) jurisdição administrativa (ou contencioso administrativo). O Poder Judiciário aprecia tão-somente os conflitos surgidos das relações jurídicas entre particulares. Os conflitos surgidos entre a Administração Pública e os administrados são resolvidos pela primeira (administrador-juiz). Esse é o sistema adotado na França.
1.7. Exercícios
1.7.1. A influência mais significativa sobre o direito administrativo brasileiro foi exercida pelo direito:
a. ( ) inglês
b. ( ) americano
c. ( ) francês
d. ( ) alemão
1.8. Leituras recomendadas
Direito Administrativo moderno.
A busca de um novo eixo central
de Robertônio Santos Pessoa
Autor: Aldemario Araujo Castro.
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Brasília, 3 de outubro de 2005.